sábado, 6 de fevereiro de 2016

CONTO DE CARNAVAL - 26/02/2006

A pior coisa que pode acontecer com um homem.  

Qual é a pior coisa que pode acontecer com um homem?
A pior coisa que pode acontecer com um homem aconteceu com o Jaílson, no carnaval. Era seu primeiro carnaval como casado. Jaílson sempre fora um folião, mas agora estava resolvido a se comportar. Por causa de Helena, sua mulher. Uma boa mulher. Gostava dele, era atenciosa, fazia suas vontades. Além de ser meiga e linda como  uma fada. era como Jaílson a chamava: Fadinha. Minha Fadinha.
Depois que haviam se caso, um ano atrás, Jaílson largara a vida boêmia de centroavante artilheiro. Sim, porque Jaílson era centroavante e artilheiro, o que significava fama, festas e mulheres. Como esse tempo de loucuras e orgias e prazeres inenarráveis havia terminado, Jaílson avisou para os amigo, quando saíram do treino na sexta à tardinha, véspera de carnaval:
-Tudo bem pessoal, eu vou tomar um chope com vocês. Mas um só, porque minha mulher está me esperando em casa.
Foram para o Liliput. O chope estava geladinho, cremoso. Um sorvete. O celular de Jaílson tocou. Helena. Ele sentiu uma irritação suave lhe premer as têmporas. Não podia fazer um happy hour inocente com os amigos que ela já ligava? Não atendeu. Pediu outro. E outro. E mais outro.
Foi então que Ieda chegou. Alta, morena, pernas longas e minissaia curta. Sua entrega no bar foi um acontecimento. Estava com uma amiga, uma loira também bonita, mais que, perto dela, não passava de uma figurante esforçada. Rildo, lateral esquerdo reserva, conhecia as duas e as chamou para mesa. Quando elas se sentaram, distribuindo sorrisos e beijinhos, o celular de Jaílson tocou de novo. Helena. Um dos amigos caçoou: - Olha a rádio-patroa!
Jaílson ficou realmente irritado, desta vez. Não bastava ela não confiar nele, ainda o expunha daquela forma!
- Certas mulheres são insuportáveis- comentou, agastado. Ieda levantou uma sobrancelha:
- Você é casado?
Jaílson pensou ter notado um acento de interessa na voz dela. Disfarçou:
-MAIS OU MENOS...
- Como alguém é mais ou menos casado?
- Casamento em crise, sabe como é...
Antes de a espuma do chope umedecer os lábios polpudos de Ieda, ela murmurou:
- Sei...
As reticências dela ficam dançando em frente aos olhos de Jaílson. Era mesmo uma morena sensacional, digna de um crime passional. Olhou para o garçom Vanderlei e espetou o indicador no ar, feito um Dom Pedro proclamando a Independência:
- Mais dois!
- e uma porção de fritas - pediu Rildo.
Quando Jaílson mordeu a última batatinha do prato, o celular tocou outra vez.
- É a esposa - ciciou Ieda, com voz irônica e rouca.
- Assim vai se tornar ex-esposa - rosnou Jaílson. E não atendeu.
Ieda riu.
- Que tal irmos ao baile das panteras? - propôs.
- Vamos! - animou-se rildco.
Jaílson vacilou. Consultou o relógio: passava dasa dez. Se fosse com eles, que hora chegaria em casa? No mínimo à meia-noite. Helena ficaria nervosa. Furiosa, decerto. Melhor seria voltar para casa...Mas...olhou para as pernas da morena Ieda, ali ao seu lado. A pele reluzente. Deviam ser macias, aquelas coxas, Deviam ser deliciosas de se tocar. Se não fosse casado...Naquele momento, o celular tocou mais uma vez. Todos na mesa riram. Jaílson bufou:
- Agora chega! - desligou o celular. E, tomando Ieda pela mão, decidiu: - vamos para o baile!
Três horas depois, o esto de Jaílson era o seguinte: o indicador da mão direita apontava para as serpentinas que pendiam no teto do clube;o braço esquerdo cingia a cintura fina de Ieda; na ponta do braço, a mão segurava uma latinha de cerveja morna. As pernas, que tantos gols decisivos haviam marcado, pareciam recheadas de maionese.
Jaílson via o mundo brumoso. A boca balbuciava mole como a defesa do Grêmio:
- Bandeira Branca amoooooorrrrrr, nçao poooooossso maissssss......
Foi como se voltasse ao seu tempo de solteiro. Acabou a noite na casa de Ieda. Ao se acordar,, com os priomeiros raios de sol, pensou na mulher. Helena, sua Fadinha, devia estar virada numa brauxa, de tão furiosa. Saiu correndo sem nem se despedir de Ieda, que dormia de bruços, nua, as nádegas rijas e redondas mal cobertas pelo lençol branco. Jaílson deu uma últim aolhada nela e sei foi. Ao entrar no carro, ligou o celular: 13 chamadas de Helena, Jesus! Dirigiu velozmente pelas ruas vazias. tentou lembra-se do que aconteceu à noite. Não conseguia. quando finalmente chegou em casa, o sol rompeu a cortina de nuvens. Depressão total, pensou. Nada mais deprimente que encerrar uma noitada ao sol da manhã. Mas o pior, ele tinha certeza, era o que viria a segui: a ira sagrada da mulher.
Abriu a porta. Entrou pé ante pé, receoso.
E foi nesse momento que lhe aconteceu a pior coisa que pode acontecer com um homem,
Jaílson deparou com o seguinte quadro: a mesa de jantar posta. No prato que era para ser seu, sua refeição predileta: filé a parmegiana. Uma garrafa de vinho aberta. Adiante, no sofá, Helena dormia. Jaílson sentiu o coração apertar de remorso.
Aproximou-se dela, pensando numa explicação.
Ela acordou. Olhou para ele com olhos inchados da noite, Mas não estava irritada, não perguntou nada, nem reclamou. Disse tão somente:
- Te esperei tanto.
E foi pior do que uma dividia de um zagueiro argentino. Foi como se tivesse quebrado Jaílson ao meio. Porque ele queria a cólera de Helena, queria que ela o xingasse e esbravejasse. Mas, não. Sua fadinha suspirava de dor. Só. Naquele instante, Jaílson soube qual é a pior coisa que pode acontecer com um Homem. Não é de ter de enfrentar a revolta de sua mulher. É ter de conviver com a tristeza que ele mesmo causou.


- Esse texto de David Coimbra me fez lembrar de várias coisa que aconteceram em época distintas, acho que todos nós acabamos por relembrar fatos de antigamente, de serpentinas e purpurinas e marchinhas de carnaval. Ò lua, é de madrugada, diga onde anda minha doce amada....
Dos carnavais no clube do professor gaúcho que voltei para casa com uma professora, uma morena de pernas lindas, das quais eu não me cansava de passar a mão, de ter ficado com o telefone, mas nunca ter ligado, de tê-la encontrado no ônibus e ter dito que era meu irmão gêmeo. Ela gostou mesmo de mim e insistiu na conversa. Dos beijos...
De ter chegado uma vez em casa, com o sol raiando e esquecendo que a sogra estava na minha casa, e abrir a porta e dar de cara com ela, perguntando o que havia acontecido. Eu havia dormido demais, na casa de uma amiga, e quando ela me acordou, eu disse, putz como é que isso foi acontecer? De uma noite acordar na escuridão, não sabendo onde estava com certeza, torcendo que estivesse em casa, mas torcendo mesmo e desejando, mas quando acende a luz percebe que não está em casa, e nessas horas que a gente vê: como é bom estar em casa, na nossa cama, com o nosso travesseiro. De uma vez ter deixado meu travesseiro na casa de uma namorada e não ter voltado pra buscar.
De viagens de trem, de rainhas de carnaval. De namoros inciados em enterros dos ossos.
De uma vez no bar, o cara ter jogado a cerveja do copo na cara da ex-namorada.
Do atraso na anti-véspera da natal para comer o perú, quando eu já havia até jantado...de ter passado uma semana na praia com a mulher, não sabendo nem aonde era, cantando nos videokês, tentando arrumar explicações para as amigas que não entendiam porque as coisas aconteciam daquela forma. De se doar, doar, doar para família e ...procurando relembrar os momentos que eram possíveis fazer de tudo sensações de uma vida vivida pela metade e nunca ter a certeza de onde realmente chegar.

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